Espanha é destino de alagoanas traficadas, segundo Núcleo Estadual
Suspeita é do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico, com dados da Polícia Federal
Alain Lisboa
13/05/2013
Três casos de tráfico de pessoas já foram registrados pelo Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas em Alagoas, mas em nenhum deles o autor foi penalizado. A prática do crime é antiga no mundo todo. O Governo Federal combate o tráfico no país desde 2002, mas só há cinco meses um Núcleo foi implantado no Estado, vinculado à Secretaria da Mulher, da Cidadania e dos Direitos Humanos, que já diagnosticou a maior dificuldade desses primeiros passos: muitas pessoas ainda não acreditam que o traficante pode estar próximo e acabam enganadas e traficadas, muitas vezes sem saber, sem tempo e oportunidade de denunciar.
Das três denúncias registradas no Estado, duas estariam ligadas ao fim de exploração sexual em países da Europa. A investigação da Polícia Federal é norteada pelas denúncias dos familiares. Segundo o Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, nos dois casos de Alagoas, a Espanha teria sido o destino das supostas vítimas, ambas do sexo feminino.
“Nos casos que a gente atendeu, a suspeita é a Espanha, mas as famílias sabem muito pouco a respeito. Pra você ter uma ideia, quando a gente pergunta, elas não foram nem até o aeroporto levar a filha pra ter certeza se realmente foram para a Espanha”, disse a advogada do Núcleo, Thays Agra.
A assistente social Thaisa Costa, que também faz parte do grupo, confirma a suspeita.
“Temos informações ainda extraoficiais com pessoas que saem do Estado com destinos internacionais. E um dos maiores destinos é a Espanha, como é a característica, na verdade, do tráfico de pessoas no Brasil”, confirmou.
Casamento servil
Núcleo atende vítima levada para outro estado
Nem todo tráfico de pessoas está relacionado a outros países ou pessoas estrangeiras. A terceira denúncia que chegou ao Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas em Alagoas enquadra a suposta vítima do tráfico na modalidade casamento servil.
Uma jovem teria sido levada por um parente para trabalhar para ele em outro estado do Brasil. Porém a denúncia foi feita tardiamente, pois o acusado, que era tio-avô da vítima, morreu. A menina está sob orientação do Núcleo de. “A pessoa já faleceu e não há como fazer a responsabilização desse autor, desse crime. Nesse caso, estamos fazendo atendimento à vítima”, disse a advogada Thays Agra, integrante do órgão.
Caso estivesse vivo para responder aos processos, o acusado poderia responder também por outros crimes. “O tráfico de pessoas se associa a outros crimes correlatos. Há tráfico, mas ali tem um cárcere privado, tem uma violência física”, explica a assistente social do Núcleo, Thaisa Costa.
“Ainda não temos um caso de vítima real. Não temos um caso concreto, são denúncias. A família procura o Núcleo, preocupada porque as filhas que foram trabalhar no exterior não dão notícia há vários meses. A Polícia Federal fica com a parte das investigações de acordo com o que a família relata”, explicou Thays Agra.
Até o fechamento desta reportagem, a Polícia Federal em Alagoas não se posicionou sobre o andamento das investigações de tráfico de pessoas no Estado, mesmo após vários contatos por telefone e email.
De acordo um relatório do Ministério da Saúde, em nível nacional, as vítimas de tráfico em sua maioria são mulheres na faixa etária entre 10 e 29 anos. Também há uma grande incidência entre as que estão na faixa etária entre 10 a 19 anos, de baixa escolaridade e solteiras.
O Ministério da Justiça classifica o tráfico de pessoas o “recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou ao uso da força ou outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração”. Numa dessas hipóteses existe vítima.
Sem dados
Crime ainda é invisível para o poder público
O Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas em Alagoas é uma das 16 unidades que existem no país e insiste em lembrar que o tráfico de pessoas é invisível devido à falta de registros de casos que o caracterizem. “Nem as reportagens de antigamente citam que as pessoas foram traficadas. A mídia é quem está pondo o assunto em evidência”, disse a advogada do núcleo Thays Agra.
“Temos que entender a questão do tráfico. O Brasil hoje está juntando todas as informações nos estados para poder, em Brasília, ter uma informação única. Até agora você não está vendo conexão, é nada com nada”, completa a secretária Kátia Born.
A divulgação do Núcleo é o objetivo principal da primeira fase em Alagoas. Ele é formado por uma assistente social, uma advogada e um psicólogo, que realizam pesquisas de casos passados para encontrar associação com o tipo de crime e atualizá-los. “Por enquanto, esses seis meses, estivemos fazendo reuniões e mapeando o Estado de Alagoas”, disse a secretária.
“As pessoas que tiverem qualquer tipo de informação, que nos procurem, procurem a Policia Federal, procurem o Ministério Público, para que a gente possa proteger a sociedade alagoana, porque o que mais acontece é a saída de jovens na idade de 17 e 18 anos de Alagoas para fora do país”, analisou Kátia Born. “É preciso fomentar a discussão sobre o tráfico de pessoas para preveni-lo”, completou.
Matéria retirada do Site Tribuna Hoje.